segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Origem da palavra Samba e sua significação

Essa é uma reflexão sobre o significado da origem da palavra e do ritmo Samba, realizado por Mário de Andrade.

"1. Qualquer bailarico popular. "“ Esta ai um preso. Furou, inda agorinha, um homem, num samba pras bandas da Estação"" (Queiroz, R. João Miguel, 1932,Pag. 10) (MA)
2. Dança de salão, aos pares, com acompanhamento de canto, em compasso 2/4 e ritmo sincopado. Admite três construções: a) introdução instrumental, solista(estrofe) e coral(refrão); b) em três partes, mas sem estrofe e refrão; c) introdução e estrofe. A este samba Renato Almeida chama de samba carioca ou de salão. (Historia da música brasileira, 1942, pag. 191).
3. Dança de roda. Mozart Araújo acredita que a palavra tenha derivado de Semba, vinda da África, e ""significa a embigada que o dançarino do centro dá num dos circunstantes da roda, para convidá-lo a dançar"". O autor classifica este samba como evolução do batuque, jongo e lundu, de origens africanas. ""Este um roteiro bem provável para explicar, de um modo geral, a evolução do samba que, como se vê, formou-se no Brasil através do tempo, onde ele é um momento do lundu, seu avô."" Há diferenças regionais como o baile do norte, da Bahia, rural (São Paulo) e de morro (Rio de Janeiro), "" dança de roda, com forma responsorial - solo e coro."" (Cabral, M. Depoimento sobre o samba. Folha Carioca, 19 DE DEZEMBRO 1944, PAG. 4, IN: Dic. mus. brasileiro, IEB-USP).
Em São Paulo o termo já era conhecido em 1889 pelo que se infere do relato das atas da Câmara Municipal de Avaré. No natal daquele ano José Antônio Piranha infringira o Código das Posturas e para defender-se delatou o Capitão Antonio Gabriel que, por sua vez, foi defendido pelo fiscal municipal que registro: ""Não me consta que houvesse jogo de búzio e cateretê ou fandango em outras casas, nas quais apenas fizeram tocatas que são divertimentos próprios da noite de natal havendo nos quartos do Capitão Gabriel um divertimento denominado samba, o qual não me pareceu proibido pelas posturas, (...)"" ( A novidade do Samba em Avaré. O Estado de São Paulo, 12 de dezembro, 1937, in: Dic. mus. brasileiro, IEB-USP).
Floriano de Lemos, compositor que em 1903já morava no Rio de Janeiro, acompanhou a fixação do termo e afirma que é de origem nordestina, do significado queixar-se, rezar. E é igualmente uma dança religiosa, em louvor da divindade, uma cerimônia do culto. (A ciência do samba. Correio da Manhã, 28 de novembro, 1943, in:Dic. mus. brasileiro, IEB-USP). (DM-MA)
Mário de Andrade aponta outras origens prováveis do termo e da dança:
Não virá de zâmbia?
No século XVI já é usada na Espanha o zamba que se assemelha bem aos sambas de negros que vi no carnaval do Brás por 1930, 31, 32. (Pfandl, L. Spanich Kultur..., 1924, p.181).
Nota-se que na Venezuela, Colômbia e terras andinas zambo, zamba designa o mestiço de aborígene com preto. (Pronuncie Sambo, Samba). (Friedenthal, A. Musik, Tanz und Dichtung, 1913, p. 147 e170).
A palavra conheceu seu verdadeiro período de ostracismo, no início deste século, uns vinte anos depois que abolida a escravatura, vinda a república, novos progressos e liberdades maiores, igualações do preto ao branco, fizeram os sambas legítimos rarearem no Brasil. Ainda mais, adotado pelos brancos rurais, como forma coreográfica, como elementos rítmicos e melódicos, como forma musical, à medida que se deformava pouco ou muito na mão destes, também originava um desperdício das variantes, que desde muito tinham seu nome como é o caso do Coco. Por tudo isso o "“ Samba “" como palavra e coisa rareou muito. Era expressão literária caracterizando um passado, e objeto apenas duma ou doutra composição impressa, mais ou menos erudita. Até que os maxixeiros e compositores de maxixes principiaram empregando a palavra de novo, não para designar a coreografia antiga afro-brasileira, mas um caráter regional de maxixe: ""Maxixe"" se dizendo das peças de sensibilidade e movimento especificamente cariocas e ""samba"" ao maxixe de origem e jeito rural, com especialidade nordestino.
José Veríssimo dá a palavra samba como ""de origem africana perfeitamente assentada."" (Scenas da vida amazônica, 1886, p. 24).
No século XIX era substantivo feminino. Pelo menos também feminino.
Celso Magalhães (Maranhão) citado por Teófilo Braga (Historia da poesia Popular, v. 2, 1902, p. 430) escreve: "“ Os bailados, os bandos de São Gonçalo, as sambas, os maracatus (...) “".
Denys Périer descreve processo característico de cantar dos negros congoleses que se assemelha exatamente à improvisação dos textos e temas dos nossos sambas rurais do Centro. Os remadores nas viagens vão indo aos golpes de tantã, e de tempo em tempo o solista pra animar o grupo, evoca qualquer coisa que interesse os remadores:
“" - Estão querendo açúcar?
-Sim,
Respondem em coro longamente. Tudo cantado, o tema foi achado, o leitmotif que ajuntará as estrofes. "" Notar que o processo improvisa tório dos Blues obedece ao mesmo princípio. (Nègreries et curiosités..., 1930, p. 121). Descrição de gestos e passos dum samba, admirável em Catulo da Paixão Cearense ("“ Ö juramento “", Poemas Bravios, 1928, p. 161):
““ Quando eu cheguei a cabôca/ já tava se preparando/ pra sambá!
Thereza era uma andorinha.../ taliquá!
Ameaçava n'um cantinho,/ A punteá, cum os dois pezinhos,/ sempre no mêmo lugá!
Depois ia de mansinho,/ abrindo os braços prôs lado,/ cumo querendo avoá!
Ficava toda tremendo,/ toda a se saçaricá,/ assim como um passarinho,/ na bêra d'um corgozinho,/ satisfeito a se levá!
Depois, a toda sacudida,/ Saia a sapateá!
Depois, de repentemente,/ naquele avôo aparando,/ fica a tramê no á!...
Prá depois vim se abaixando,/ e logo se levantá,/ e, de novo, vim brincando,/ inté cum o chão rastejá.../ e avoando, sempre avoando,/ se perdê de nosso óia,/ cumo faz uma andorinha,/ quando é tempo de viajá.
Desde essa noite, seu moço,/ cumecêmo a namorá. "“
O samba rural de negros paulistas (e possivelmente de toda região central do país) se distingue bem na coreografia e no ritmo musical, dos sambas e baianos e nordestinos. Este se aproxima bem mais do maxixe, tem a sincopa (existente ou não) como elemento básico do ritmo. Já o samba paulista, também na terminologia popular nomeado "“ batuque “", não tem a sincopa como base rítmica e é um verdadeiro one-step bem batido nos tempos, exigindo a coreografia andadeira do one-step. O passo se faz balanceado prá frente do corpo, sem o balanceamento lateral de ancas próprio do maxixe e dos sambas e mesmo cocos do nordeste. A Bananeira (disco Arte-Fone, n 4023) é um verdadeiro protótipo do samba rural afro-paulista.

Nenhum comentário: